quinta-feira, 9 de julho de 2009

Mestre Gay

GAY TALESE NO BRASIL Impecável, ele surge por trás das cortinas escuras do lotado Auditório do Museu de Arte de São Paulo, o MASP. Trajando terno escuro, mais discreto que as outras combinações usadas durante sua estadia em Paraty, RJ, e carregando seu chapéu Panamá nas mãos, Gay Talese ouve os aplausos tímidos vindos de uma plateia, em sua maioria, formada por jovens jornalistas e estudantes, ávidos a ouvir suas histórias.

Sim, Gay Talese não reporta fatos, ele conta histórias. E para ele, essa deveria ser a verdadeira função do jornalista, ouvir e contar histórias, com uma riqueza de detalhes que possibilite ao leitor não estar diante apenas de um texto, mas de uma imagem. E dessa forma, construindo figuras, tornou-se um dos expoentes do new journalism, ou jornalismo literário.

Mediado pelo jovem editor do jornal O Estado de S.Paulo Ilan Kow, e também sabatinado pela plateia, Talese, de 77 anos, contou sobre sua carreira, tentando, com sua experiência, passar aos jovens que ali estavam noções de como um verdadeiro jornalista deve se portar.

Ao falar sobre sua chegada ao New York Times, com 21 anos, onde começou de baixo, como copy-boy - uma espécie de faz-tudo do jornal - contou sobre sua primeira reportagem publicada no diário. Durante sua hora de almoço, o jovem Talese, subiu ao terraço do edifício do Times, onde encontrou o homem que considerava ter uma das melhores profissões do mundo: era ele quem transcrevia as manchetes para o letreiro do jornal na Times Square.

Durante uma hora, tomou nota de sua história, e depois redigiu um texto, e o apresentou a alguns repórteres do Times. O editor aprovou a história, mas quis checá-la antes de publicar, com o nome de outro repórter…

Reconheceu a dificuldade dos jornais em preferir textos que se preocupem com histórias curiosas e de pessoas anônimas, e que só teve mais espaço pra contar essas histórias, com o tempo e o respeito adquirido.

Em resposta a Ilan Kow, falou sobre seu relacionamento com a Internet. Ressaltou que não tem e-mail nem celular, e criticou os novos jornalistas que se prendem às telas de seus laptops e não saem às ruas. Mas comentou suas experiências na blogosfera.

No Blog de Tina Brown, The Daily Beast, Gay Talese escreveu com espanto sobre uma liquadação de calças DIESEL, marca desconhecida por ele, até o dia em que se deparou com uma gigantesca fila no quarteirão de sua casa, próxima a Madison Avenue, em NY, em plena crise econômica.

Ainda tendo como pano de fundo a crise, escreveu no início do ano para o blog do nytimes.com sobre os pedintes nas ruas de Nova York. Ele observou que os mendigos mantinham sempre as mesmas frases nas placas em que solicitavam dinheiro, Talese aconselhou, então, que eles, usando o pacote de incentivo do presidente Obama como frase de efeito, modificassem os cartazes, dando um ar mais criativo ao pedido de esmola.

Para Talese, foi um teste. Ele queria saber se as pessoas ajudariam mais os pedintes, baseando-se nos fatos noticiados pela mídia. Manteve contato com os pedintes – um deles tinha um celular em cada bolso –, para saber se as pessoas estavam mais caridosas e obedeciam as recomendações do novo presidente. Com certeza, foi experiência válida para os mendigos.

Ainda sobre a Web, garantiu que a Internet não matará os jornais, mas que isso poderá acontecer devido aos erros da imprensa, interessada mais na velocidade da informação que na notícia em si. Porém, ressaltou que sempre haverá espaço para o jornalismo de qualidade.

Comentando a discussão atual no Brasil sobre necessidade ou não do diploma para o exercício de jornalista, Gay Talese, graduado pela Universidade do Alabama, disse que o principal para o exercício da profissão é a curiosidade.

Sobre o jornalismo atual, disse que é perigoso o jornalista se misturar com o poder. Atualmente, segundo Talese, baseando-se no que observa em Washington, jornalistas e políticos frequentam os mesmos ambientes, os filhos estudam nas mesmas escolas, e isso pode prejudicar a apuração dos fatos e a publicação das notícias. Os jornalistas não estariam mais publicando toda a verdade. E deu como exemplo a guerra do Iraque, e a falta de discussão sobre a existência das armas de destruição em massa, que não existiam de fato.

Sobre a morte do popstar Michael Jackson, que foi homenageado naquele dia em Los Angeles em um funeral-show transmitido para todo o mundo, disse que boa parte daqueles jornalistas que enalteciam a figura de Michael como rei do pop, são os mesmos que um dia desmancharam sua imagem.

O evento, organizado pelas revistas piauí e Serrote, pelos jornais O Estado de S.Paulo e O Globo, e pela editora Companhia das Letras, levou ao auditório do MASP, muito mais que coisas para se ouvir, mas para refletir. Gay Talese deu uma verdadeira aula, que serviu de alerta aos jovens que se encontravam lá naquela terça-feira, 7 de julho de 2009.

Em um mundo cada vez mais ágil, com um fluxo maior de informações, o importante é parar, apurar, e não deixar que o jornalismo perca sua qualidade.

Agora, com licença, preciso desligar esse laptop e abrir essa porta.

Foto-A0421

2 comentários:

Anônimo disse...

Parabéns Felipe! curti bastante este post, adoraria ter ido à Parati pra ouvir o Talesse, você já leu algum livro dele?
abraço!
Bruno

Anônimo disse...

Parabéns Felipe! curti bastante este post, adoraria ter ido à Parati pra ouvir o Talesse, você já leu algum livro dele?
abraço!
Bruno